terça-feira, 15 de dezembro de 2009

BOLSA-AVIÃO

Deputado mineiro propõe bolsa transporte aéreo para idosos

Há uma máxima bem conhecida aqui em Brasília que diz o seguinte: quando um deputado acha que tem uma boa ideia é bom que o contribuinte preparar o bolso. O deputado federal Humberto Souto (PPS-MG) resolveu ter a sua e o resultado pode não ser muito bom para quem anda regularmente de avião. Depois do Bolsa-Família, Vale Gás, Vale Cultura, Vale Enterro e outras bondades caça-votos, Souto quere criar o Bolsa-Avião.

Humberto Souto apresentou proposta de lei na Câmara dos Deputados que cria a gratuidade no transporte aéreo para maiores de 65 anos. Ele quer estender para os céus do Brasil o direito de até duas vagas gratuitas por veículo nas viagens de ônibus interestaduais para os idosos que ganham até dois salários mínimos. E mais: nas viagens em que a cota for excedida, o idoso tem garantido desconto de 50% nos preços das passagens. Nem os prosélitos do PT, nos seus delírios de porta-voz da pobreza, chegaram a tanto.

O deputado federal mineiro argumenta que, se aprovada, a medida não trará nenhum prejuízo às empresas aéreas, visto que a grande maioria dos voos brasileiros é realizada sem a lotação máxima. Errado. As empresas não vão ter prejuízo porque elas simplesmente vão repassar o mimo proposto pelo deputado para o custo das passagens dos demais usuários dos serviços de transporte aéreo de passageiros.

Humberto Souto não economizou na demagogia. Em discurso no Congresso, ele lembrou que “o tempo de viagem nos ônibus muitas vezes é um impeditivo para que pessoas idosas com saúde mais fragilizada possam visitar parentes, cuidar de seus interesses nos grandes centros, ou fazer um tratamento de saúde”. E aí está um ponto a ser considerado: mais de 90% dos municípios brasileiros não são atendidos por esse tipo de transporte.

A maior parcela da população brasileira migrou para os grandes centros é verdade, mas talvez o pacote de bondade do deputado não sirva para boa parte do seu eleitorado de quatro décadas: o norte-mineiro enfurnado nos sertões sem avião. Montes Claros, a principal cidade da região, tem serviço apenas sofrível de transporte aéreo de passageiros.

O lobby das poucas empresas que atuam no setor da aviação civil certamente vai fazer de tudo para engavetar o projeto de Humberto Souto. Mas a proposta é bem sintomática da atualidade brasileira e das inúmeras tentativas de resolver numa canetada as desigualdades sociais que tanto envergonha o país. A coisa vai num diapasão em que as pessoas só têm direitos, porque deveres é uma chatice que não rende votos.

Agora mesmo o Brasil comemora o fato de protagonizar um dos maiores programas de transferências de renda do mundo. Beleza. Mas falta fazer o dever de casa e oferecer as chamadas políticas públicas emancipatórias, a oferta de boa educação entre elas. Por enquanto, o que há é uma suave convicção de que o governo tudo proverá. Até passagem de avião.

Nada contra o direito dos nossos idosos andarem por aí de avião. O Brasil é mesmo um país continental em que o melhor meio de transporte seria mesmo o avião. Se fosse barato. Bom mesmo seria se todo mundo, até a turma do Bolsa-Família, também flanasse por aí nas asas da viúva. Mas não é assim que o mundo funciona. O próprio deputado já tem idade bem avançada, como mostra os cabelos brancos da foto em que faz mesura a um ancião lá no alto. Por enquanto ele tem mandato, e por isso tem passagens aéreas pagas pelo contribuinte.

Souto vai às urnas daqui a dez meses em busca da sexta ou sétima eleição para o Congresso Nacional. É legítimo que queira marcar posição junto ao eleitorado. A usina de ideias em que se transforma a cabeça dos deputados nessa época ainda nos leva ao paraíso na Terra. E assim caminhamos: com foco no acessório e com prejuízo do essencial. Até que não seria má ideia se os deputados pensassem menos. No caso em questão, o resultado será apenas o de transformar ainda mais caras a já inacessíveis passagens aéreas para o brasileiro comum, que paga impostos e pouco recebe em troca.
Luís Cláudio Guedes

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